Salas ou filas de espera; enquanto esperamos alguém ou que o computador arranque; são inúmeros os momentos de tédio na nossa vida. Mas contêm um benefício oculto.

Photo by Julian Howard on Unsplash
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O que é

O tédio não é mais do que a experiência que fazemos quando transitamos de um nível de elevado estímulo para outro mais baixo, e sentimos a necessidade de nos adaptarmos subitamente a esse nível.

É algo que acontece no tempo e daí advém a sensação de perda de tempo quando se experimenta o tédio. Quando o ambiente exterior deixa de nos interessar, a nossa atenção volta-se para o nosso interior onde os pensamentos que antes eram negligenciados passam a ser infinitamente mais interessantes e estimulantes.

Esta passagem gerada pelo tédio do estímulo exterior para o pensamento interior abre a porta de uma das capacidades humanas mais extraordinárias: a criatividade.

Focarmos a nossa atenção nos pensamentos soltos que atravessam a nossa mente em momentos de tédio, leva-nos a processar ideias deixadas para trás, realizar associações outrora impensadas, e relacionar desejos futuros com momentos presentes e experiências passadas.

Não é que o tédio seja uma experiência agradável. Daí que na ausência de estímulo, a primeira atitude seja procurar institivamente por algo que nos distraia e ocupe a nossa atenção. É essa a razão de pegarmos imediatamente no telemóvel e navegarmos pelas redes sociais, ler notícias, consultar emails ou trocar mensagens no WhatsApp. Tudo se torna o pacificador que nos distrai do rebuliço de pensamentos que atravessam a nossa mente. Mas ceder a estas armas de distracção massiva é cegar o olhar em relação ao benefício oculto do tédio.

 

Pensamento Profundo

O pensamento profundo exige tempo e muito poucos estímulos exteriores. Os momentos de tédio abrem-nos a essa possibilidade apesar de nos fazerem sentir desconfortáveis e ansiosos. Talvez o que nos falte seja estarmos conscientes dessa possibilidade e fazermos a experiência.

Quando os computadores com o Windows ficavam muito lentos, uma das ferramentas que utilizávamos para os tornarmos mais rápidos era o “desfragmentador do disco.” Na prática, o objectivo dos momentos de tédio é semelhante, ou seja, desfragmentar os pensamentos. Pois, quando somos sujeitos a essas situações, abre-se-nos um tempo extra para processar relações, experiências, ideias e problemas que, de outro modo, não haveria tempo para isso.

Num mundo que transita do dinheiro para o tempo como o bem mais precioso, se mais dinheiro permite-nos ter mais, mais tempo permite-nos ser mais, uma vez que os nossos pensamentos são expressão daquilo que somos.

Mas há mais a extrair do tédio do que pensamos. O tédio ajuda-nos a compreender o tempo e nós próprios.

 

O Antídoto

Podemos não nos dar conta, mas quando nos sentimos aborrecidos experimentamos o tempo na sua forma e conteúdo mais puros. E em vez de explorarmos esse contacto privilegiado com o tempo, optamos por entrar no mundo da distracção que chega ininterruptamente às nossas mãos pelos pequenos écrans.

E se muitos de nós temos memória de um passado onde a experiência do tempo que passa não se traduzia logo em aborrecimento, hoje, sobretudo para os mais jovens, o desconforto que sentem com o passar do tempo sem estarem a fazer alguma coisa com os dedos é grande e não têm outra experiência senão esta. O facto dos mais velhos não darem o exemplo, significa que falhamos na missão de ensinar aos mais jovens como sentirem-se mais confortáveis com o tempo e tirarem partido dele.

”Uma geração que não consegue aguentar o tédio será uma geração de homens pequenos, de homens excessivamente divorciados do processo lento da natureza, de homens onde cada impulso vital se definha lentamente como se fossem flores cortadas num vaso.” (Bertrand Russell)

Qual é, então, o antídoto para o drama do tédio?

Pensar.

 

Encontro

Pensar é o melhor antídoto para o tédio. Se estás a viver um momento aborrecido, pensa nisso. Em alemão, a tradução para a palavra tédio é langeweile cuja etimologia aponta para um longa pausa que expressa como o tempo parece mais lento quando estamos aborrecidos.

O drama que essa longa pausa traduz é a tortura que muitas pessoas sentem quando são incapazes de estar a sós com o que lhes passa pela mente. Daí que educar a lidar com o que designaria por silêncio cognitivo seja crucial.

Observa como a tua mente responde ao aborrecimento. O que sentes quando estás aborrecido? Em que pensas? Ao contrário do que se pensava antigamente, estar junto com os nossos pensamentos não é uma forma de distracção, mas um modo de compreender o que se passa dentro de nós e de processar o que se passa com o mundo, ou seja, fora de nós.

O tédio é o momento de pausa em que as emoções se recolhem na tranquilidade, como diria o poeta William Wordsworth, e damos espaço à reflexão que dá sentido e significado às horas vazias onde estamos, simplesmente, ali, naquele lugar qualquer, e vivemos a única coisa que realmente temos… o presente.

O silêncio cognitivo é o momento de encontro com os nossos pensamentos. Um momento de pausa que é mais fácil de encontrar quando sentimos o aborrecimento ou tédio. Mas é algo mais.

”O tédio é o último privilégio da mente livre.” (Gayatri Devi)

A mente que ao encontrar-se livre com os seus pensamentos encontra a oportunidade de recuperar a criatividade que nos torna únicos.